Um dia depois da passagem do governador André Puccinelli (PMDB - candidato à reeleição) por Corumbá o cumprimento de uma ordem judicial – na defesa do interesse público – pode estar sendo usado politicamente neste período eleitoral. A ordem de despejo do pedreiro Lauro Mendes Muniz, 31, ocorrida na quinta-feira, 29 de julho, veio à tona nesta terça-feira, 03 de agosto, carregada de conotação político-partidária. Equipes de produção de programa eleitoral captaram imagens e entrevistas para utilizá-las em horários eleitorais gratuitos. Fotos também foram tiradas por veículos de comunicação.
No dia 22 de junho, a Justiça de Corumbá expediu uma ordem de desapropriação determinando que Lauro deixasse o lote no bairro Guatós para a construção de 84 moradias dentro do programa PAC-Casa Nova. De acordo com a notificação, o pedreiro tinha 30 dias para desocupar a área, já desapropriada judicialmente. O Município tentou acordo, negociou com ele, dilatou o prazo, mas no dia 29 de julho, cumpriu a decisão da Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos para a desocupação do local.
“O imóvel [localizado na 'quadrante das ruas Alexandre de Castro, Rio Grande do Norte, 7 de Setembro e Major Gama'] já estava desapropriado por utilidade pública em razão das obras para construção do conjunto habitacional. As máquinas estavam paradas aguardando a desocupação desse local onde ele estava. De fato, havia sido notificado 37 dias antes da data que foi despejado. Foi notificado dia 22 de junho e nós aguardamos uma semana para ver se ele desocuparia voluntariamente. Porém, não houve nenhum ato neste sentido e não restou alternativa, senão pedir ao Judiciário a desocupação forçada, como de fato ocorreu”, explicou ao Diário o advogado do Município, Alcindo Cardoso do Valle Júnior, que acompanhou o cumprimento da ordem judicial no final do mês passado. “Ordem judicial tem de ser cumprida. Município; Estado e União têm que agir em prol do interesse público acima de qualquer interesse particular”, complementou. O advogado do Município argumentou que houve tentativa de acordo com Muniz, mas, diante das negativas, “não restou alternativa senão buscar o meio judicial adequado, observando os prazos e dando dilação de uma semana”. Alcindo Valle Júnior destacou que nas ações a determinação “sempre é buscar acordo, retirada amigável”. De acordo com os autos judiciais Lauro residia no imóvel “a título gratuito, com permissibilidade do herdeiro do requerido”.
As tentativas de acordo para a saída do local foram várias, incluindo a possibilidade de emprego numa empreiteira e o pagamento do aluguel de uma casa por três meses, até que ele fosse transferido para uma das casas que são construídas com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em Corumbá, informou o advogado. “O município ofereceu para o senhor Lauro a inclusão no programa habitacional e ele seria contemplado, obedecendo as formalidades legais, com uma casa desse conjunto habitacional, de preferência até no local onde ele morava. No momento da diligência, eu acompanhei o oficial de justiça, a Equipe, empreiteira que toca a obra no local, também ofereceu a possibilidade de trabalhar na construção e ser aproveitado em alguma outra obra. Porém, ele se recusou a qualquer tipo de ajuda, foi no momento até grosseiro com o engenheiro representante da empresa. Com relação ao Município, ele não aceitou nenhum tipo de ajuda e se recusou, disse que não estava sendo cumprido nada e que queria dinheiro para sair do local. Ele queria receber algum valor para deixar o local. Disse que se ele recebesse o dinheiro, ele construiria a sua casa”, afirmou Alcindo Cardoso do Valle Júnior. A informação é reforçada por certidão expedida pelo oficial de justiça que cumpriu a determinação judicial (ver documento nesta página). Ele reiterou que houve várias tentativas de acordo. “A assistente social do município esteve no local para conversar com a família, ver o que poderia ser feito e buscar uma solução adequada. Infelizmente não houve boa vontade por parte do senhor Lauro. Passando uma semana do prazo, dia 29, houve a desocupação forçada, determinada pela Justiça”, disse Alcindo do Valle Júnior. O advogado contou ainda que a mobília do pedreiro foi deixada na casa da mãe dele, a pedido do próprio Lauro Mendes Muniz. “A mãe do senhor Lauro reside imediatamente à frente desse imóvel que foi desapropriado. No ato da desocupação foram levados objetos menores para a residência da mãe dele. Os filhos também se deslocaram até a casa da avó. Só os objetos maiores como cama e armário foram colocados no caminhão da Prefeitura para que indicasse o local que gostaria que os bens fossem depositados. O pedido foi que fossem deixados na frente da casa da mãe dele, bem a frente da entrada dessa quadra”, esclareceu.
Pedreiro agora não descarta acordo
Lauro Mendes Muniz contou ao Diário que tem três filhos e havia aceitado as ofertas para deixar o imóvel amigavelmente, entretanto, afirmou “não ter visto as possibilidades de acordo serem cumpridas” e deve entrar com processo contra a Prefeitura para reparar o fato de ter sido despejado do local onde morava há dois anos e ter de ficar com o mobiliário em frente a uma casa na rua Alexandre Castro, no Conjunto Guatós.
“Eu não deixei de aceitar nada. Aceitei sim o aluguel e tudo o que eles falaram. Eu confiei nas pessoas. Eu aceitei a casa por três meses, depois eles entregariam a casa [dos programas habitacionais]. Eles estão alegando uma coisa, mas eu tenho testemunha que eu aceitei. Tenho testemunhas, elas falaram ‘o que vai acontecer depois dos três meses de aluguel?’, falaram que iria entrar para as casinhas. Foi o que me prometeram mas nada disso ocorreu”, afirmou o pedreiro.
Muniz conformou ter recebido a oferta de trabalho feita pela empreiteira. “A Equipe me ofereceu emprego, aceitei emprego sim. Falaram ‘vou colocar você numa empreiteira’ e disse ‘beleza, pode me colocar’. Falaram que iriam me colocar diretamente na Equipe e disse ‘melhorou a situação’. No entanto, esse rapaz da Equipe falou que iria pagar o aluguel e me fez essa proposta também, mas quem deveria pagar era a Prefeitura que me prometeu e nada disso ocorreu”, observou.
O pedreiro argumentou não ser beneficiário de programa habitacional. “A minha mãe tem esse benefício, foi lá na reunião e perguntou se o nome da minha esposa estava nesse negócio do PAC. Puxaram lá, não acharam Regina Maria do Carmo Guardia Muniz, não acharam o nome dela lá escrito, não tem. A assistente social ficou de vir aqui para resolver essa situação antes de ser despejado, não resolveram”, reforçou.
Para reparar os prejuízos sofridos Lauro manifestou o desejo de executar o Município na Justiça. “Estou entrando com ação contra a Prefeitura por danos morais. Meu advogado está chegando de Campo Grande, pago pela igreja da gente, sou evangélico. É uma situação de humilhação. Não acredito mais, ninguém vai tirar minhas coisas daqui e vou ficar aqui enquanto a situação não for esclarecida”, declarou. Contudo, a possibilidade de um acordo – com a cessão de uma casa para abrigar a família – pode resolver a situação. “Estou buscando um direito meu e estou entrando com processo contra a Prefeitura. Seria fundamental uma casa agora, do PAC ou, do Governo. O negócio é me dar uma casa. Preciso assentar minha família numa casa e para buscar o sustento”, complementou.
Pró-Moradia
O pedreiro Lauro Mendes Muniz está incluído entre os contemplados pelos programas habitacionais executados pelo Município, garantiu ao Diário a coordenadora Social do Projeto Casa Nova, Luciene Andreatta de Castro. Ela informou que por pedido da família, seu processo habitacional está sendo transferido para o local desapropriado pela Prefeitura para construção das 84 casas no próprio Conjunto Guatós, onde reside. “Ele está no projeto Pró-Moradia, que são das unidades habitacionais no fundo do bairro Aeroporto, próximo à extensão do Anel Viário. Numa última visita minha com a subsecretária de Obras Públicas do Município, Tânia Dantas, a esposa nos disse que gostaria de ficar naquele mesmo local. Como o processo está na Caixa Econômica Federal e toda alteração tem que ser informada, aguardamos a migração do Pró-Moradia para o Casa Nova. Hoje o nome está na Caixa Econômica Federal pelo Pró-Moradia”, afirmou a coordenadora Luciene Andreatta.
Corumbá tem 550 unidades habitacionais concluídas, mas que não podem ser entregues porque a Sanesul (empresa do Governo do Estado) ainda não concluiu a implantação dos sistemas de água e esgoto no local. O cronograma social e de engenharia apresentado pelo Município à Caixa Econômica Federal previa que as primeiras casas seriam entregues em novembro de 2009, o que até agora não ocorreu devido à falta de água e esgoto. O atraso compromete todo o planejamento da Prefeitura, tanto para a população beneficiada pelo PAC quanto para a destinação dos locais que serão desocupados, resultando em situações como a do morador despejado.